O Modelo de Coalizões de Defesa: uma análise de sua aplicação nos estudos brasileiros
Resumo
Dye (2010) – em seu trabalho sobre modelos para análise de políticas públicas – esclarece que a formulação de políticas públicas envolve a inserção de um determinado tema na agenda; a escolha das opções políticas que farão parte da proposta da política; a legitimidade dessas escolhas através de apoio político do Legislativo e no Executivo (entre outros atores estatais e da sociedade civil interessados no tema proposto); e, por fim, a implementação da política por meio do aparelhamento administrativo. Ou seja, recursos humanos, financeiros, materiais, tecnológicos, etc, são importantes para que determinada política pública seja efetivada.
Seguindo esse entendimento o Modelo de Coalizões de Defesa (Advocacy Coalition Framework - ACF), proposto por Paul Sabatier no final dos anos 1980, enquadra-se como um modelo de análise de formulação de política, pois contempla todas as fases do ciclo de políticas e não apenas uma etapa. Dessa forma, quem se utiliza do ACF visa estudar uma política de forma holística, em sua completude, e não faseada nos estágios clássicos do ciclo de políticas públicas.
De acordo com Sabatier e Weible (2007) o modelo está alicerçado sobre as seguintes bases: (1) nível macro, no qual a maior parte das políticas ocorre entre os especialistas dentro de um subsistema de política, porém seu comportamento é afetado por fatores do sistema político e socioeconômico mais amplo; (2) nível médio, no qual a solução para lidar com a multiplicidade de atores em um subsistema é agregá-los em coalizões de defesa e (3) no nível micro, no qual a convicção vem a partir da psicologia social. Esses pressupostos básicos afetam as variáveis dependentes do modelo – crenças e mudança política – por meio da aprendizagem orientada as políticas e pelas perturbações externas. Na revisão mais recente do modelo esses autores adicionaram mais dois caminhos para explicar a mudança política: choque interno e o acordo negociado. Esses fatores agregados às hipóteses originais do modelo afetam os constrangimentos e oportunidades dos atores do subsistema ao longo do tempo.
O mapeamento dos trabalhos que se utilizam do ACF em âmbito internacional já foi realizado (Weible et. al. 2011) e, sendo assim, busca-se nesse trabalho analisar de que forma o Modelo de Coalizões de Defesa vem sendo aplicado pelos estudiosos brasileiros enquanto unidade de análise de uma política setorial específica.
Esse trabalho se justifica na medida em que as dissertações e teses tendem a apresentar a revisão bibliográfica do modelo teórico do ACF conjuntamente com estudos de casos diversos e, praticamente, inexistem revisões que abordem a utilização do ACF no Brasil enquanto referencial teórico[1]. Tendo em vista essa lacuna, levantamos os seguintes problemas de pesquisa: quais as dificuldades foram encontradas para transpor esse modelo para a realidade do nosso sistema pluralista? Os três eixos centrais do modelo são aplicados? Se sim, de que forma? O modelo fornece critérios claros para explicar o processo de políticas públicas no Brasil? Essas são apenas algumas questões que mostram a necessidade de verificar a incorporação desse referencial teórico pelos pesquisadores.
Para responder a tais questionamentos, foram selecionados dezessete trabalhos (entre dissertações de mestrado e teses de doutorado) que utilizaram o ACF enquanto referencial teórico, no período de 2000 a 2013. Para tanto foram pesquisadas as bases da CAPES, a BDTD e as bibliotecas virtuais de teses e dissertações das Instituições de Ensino Superior com maior incidência nos resultados preliminares – no caso a Universidade de Brasília (UNB), Fundação Getúlio Vargas (FGV) e Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)[2].
Os resultados obtidos mostram que dos dezessete trabalhos analisados apenas em metade verificou-se a tentativa de incorporar esses três eixos do modelo na análise. Os demais trabalhos fizeram apenas uso parcial do modelo e utilizaram o referencial teórico de coalizões para mapear atores, ideias e identificar as coalizões.
Bibliografia sintetizada
CAPELARI, M. G. M.; CALMON, P. C. P; ARAÚJO, S. M. V. G. Coalizões de Advocacia: levantamento das teses e dissertações nacionais. Série Textos de Discussão CEAG/UnB. 2014
CAPELLA, A. C. N; ALESSANDRA, G. S. ; BRASIL, F. G.. Pesquisa em políticas públicas no Brasil: um mapeamento da aplicação de modelos internais recentes na literatura nacional. IX Encontro da ABCP, 2014.DYE, T. R. (2010). Mapeamento dos modelos de análise de políticas públicas. In: HEIDMANN, Francisco G.; SALM, José Francisco (Orgs). Políticas Públicas e desenvolvimento: bases epistemológicas e modelos de análise. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2010, 340p.
SABATIER, P. An advocacy coalition framework of policy change and the role of policy oriented learning therein. Policy Sciences, vol. 21, 1988, p.129-168.
SABATIER, P; JENKINS-Smith, H. C. Policy Change and learning: the advocacy coalition approach. Boulder: Westview Press, 1993.
WEIBLE C. M.; SABATIER, P.; JENKINS-SMITH, H. C.; NOHRSTEDT, Daniel; HENRY, Adam Douglas; DELEON, Peter. A Quarter century of the Advocacy Coalition Framework: an introduction to the special issue. In The Policy Studies Journal, vol. 39, nº 03, 2011
[1] Recentemente foram publicados dois estudos (Capella et. al, 2014; Capellari et. al, 2014) que debateram sobre a reverberação das premissas teóricas do ACF em estudos brasileiros. Porém, o que se nota é que ambos fizeram uma abordagem muito ampla e voltada a uma análise quantitativa dos trabalhos brasileiros, o que os difere deste presente estudo.
[2] Foram analisados vinte trabalhos, desses vinte, dois não faziam uso do modelo e um deles não fez parte da amostragem por falta de clareza quanto a metodologia empregada. Estes três trabalhos descartados eram dissertações de mestrado