O governo das grandes cidades: uma análise comparada dos modelos de descentralização nas capitais brasileiras
Resumo
As 27 capitais brasileiras possuem quase 24% da população brasileira, de forma que organizar a administração pública nesses espaços urbanos é um enorme desafio. A governança territorial com suas estruturas administrativas para a prestação de serviços públicos, instrumentos de interação entre Estado e sociedade e mecanismos de participação social são alguns dos desafios que as grandes cidades brasileiras têm que enfrentar. Tendo essa visão geral como referência, essa sessão busca discutir, de maneira comparada, como as capitais brasileiras lidaram com essa realidade por meio da implantação de estruturas descentralizadas de governo nos seus territórios.
A descentralização não é um tema novo no debate sobre o federalismo no Brasil, mas ainda é um debate incipiente quando se trata de analisá-lo em âmbito municipal. A análise comparada dos diferentes modelos de divisão política e administrativa em nível intra-municipal é um campo a ser explorado pela pesquisa na área de administração pública, pois pode oportunizar uma compreensão dos caminhos que as grandes metrópoles brasileiras têm implantado ao descentralizar ou desconcentrar sua gestão. Esta sessão objetiva impulsionar essa discussão para debater de que forma essa organização territorial das cidades impactou na prestação de serviços e como se dá a relação entre gestão territorial descentralizada/desconcentrada e politicas públicas setoriais (saúde, educação etc.) definidas na esfera central (dimensão administrativa), na participação da cidadania e nas formas de organização das unidades regionais (dimensão política) e na relação entre poder executivo e poder legislativo (dimensão da governabilidade, pois descentralizar a gestão municipal pode afetar interesses locais onde vereadores podem ter suas bases eleitorais).
De forma geral, a discussão sobre descentralização tem sido acompanhada por uma visão normativa: poder público mais próximo do cidadão amplia a possibilidade de controle social. O painel quer discutir se esse tópico, pois pode ser que estruturas descentralizadas localmente possam ser áreas de influência, por exemplo, de vereadores ou de outros atores sociais. Assim, pode ser que a descentralização contribua para ampliar mais os interesses desses atores políticos do que os cidadãos. Outra questão importante é a forma como se dá o processo de escolha dos administradores locais (subprefeitos, administradores regionais, por exemplo, e demais cargos gerenciais) e qual seu nível de autonomia gerencial, política e orçamentária. As características que cada modelo municipal possui condiciona a relação existente entre o nível central e suas unidades territoriais, especialmente para identificar se há mais descentralização ou desconcentração.
Administrativamente, a eficiência na prestação de serviços tem sido um argumento chave a justificar a desentralização: quanto mais perto das pessoas mais rápido e menos oneroso. Mas é importante avaliar se essa premissa é uma realidade, pois pode ser que haja fragmentação na organização dos serviços e políticas públicas, o que afeta a unidade da ação governamental. É importante avaliar como se organiza a relação entre a gestão regional e as políticas públicas governamentais nos territórios, pois tanto pode existir alinhamentos como disputas em torno da autoridade decisória. É o administrador local que tem a última palavra sobre a região, nos limites do que lhe confere o modelo legal e político, ou é o órgão central que coordena a política para toda cidade? Por fim, deve ser comparada a base legal e normativa de cada desenho de gestão regional, pois ele pode ajudar a identificar como ele se insere no interior da administração municipal.
Em termos da governabilidade, o argumento é que a descentralização permite responder com mais eficácia aos desafios da gestão urbana ao repartir responsabilidades que podem ser mais executadas localmente. Contudo, considerando que os vereadores são em grande parte eleitos com votações concentradas em alguns bairros, como se estabelecem as relações entre o desenho da estrutura territorial e os interesses locais dos parlamentares é importante de ser analisado. E isso é assim, pois pode ser que o poder executivo conceda aos vereadores influirem na gestão local em troca de apoio no parlamento para obter maiorias que lhe garantam governabilidade.
Desse modo, se espera que a sessão apresente as diferentes configurações politicas e administrativas que resultaram dos modelos de gestão territorial nas capitais brasileiras. Experiências nessa direção já existem em várias capitais como, por exemplo, em São Paulo, Rio de Janeiro, Fortaleza, Belo Horizonte, Salvador, Distrito Federal, Cuiabá, Belém, Vitória e Curitiba. Cada uma dessas cidades instititui seus modelos de descentralização ou desconcentração visando responder às três dimensões acima. No entanto, há uma lacuna na literatura sobre esse tema relativo aos governos locais no Brasil, de forma que essa sessão se propõe a contribuir para que esse debate possa gerar futuros estudos comparados.
Nesse sentido, o painel busca discutir, de forma comparada, o que segue:
1. Desenho institucional: configuração do governo da cidade com suas subdivisões e mecanismos de interação entre o nível central e territorial, bem como os instrumentos de participação cidadã.
2. Análise do contexto histórico do processo: o que ajuda a responder os porquês da forma de gestão territorial existente ter sido implantada, bem como das mudanças que tenha apresentado.
3. Resultados da implementação do modelo, com ênfase para:
a) serviços públicos: qual o impacto provocado pela descentralização?
b) participação cidadã: qual o impacto provocado pela descentralização?
c) governabilidade: qual o impacto provocado pela descentralização na relação entre governo central e gestão local? Qual o impacto da descentralização na relação entre governo municipal e a câmara de vereadores?
4. Avaliação: avanços que esse modelo de gestão trouxe à cidade, desafios que enfrenta e medidas que poderiam ser adotadas para qualificar esse processo.