Governo Aberto: um novo paradigma na relação Estado-sociedade?

Laila Bellix

Resumo


Governo Aberto: um novo paradigma na relação Estado-sociedade?

O cenário político atual tem se tornado um laboratório para análise dos fenômenos de contestação pela sociedade e das respostas adotadas pelo Estado. Há elementos explicativos que permitem refletir sobre as mudanças que esses movimentos contemporâneos têm trazido à forma de contestação por parte da sociedade civil.

Por esse motivo, o estudo tem por objetivo debater os limites e os descompassos da relação Estado e sociedade e, a partir das experiências consolidadas de governo aberto, apresentar as condições infra e superestruturais colocadas para que a prática de “abertura de governo” torne-se permanente e consolide-se em um novo paradigma da gestão pública.

Esse estudo busca explicitar como os movimentos contemporâneos representam um novo modo de compreensão da ação política, de modo a exigir transformações na relação Estado e sociedade. Também, lança luz sobre as possíveis agendas a serem fortalecidas pelo Estado, principalmente na consolidação de processos de abertura política e da ampliação de sua esfera à participação, transparência e inovação tecnológica.

 

  1. Movimentos contemporâneos: novo modus operandi da ação política e o descompasso estatal

 

Para compreender a agenda política atual dos governos, é necessário identificar a caracterização do descompasso entre as instituições estatais e as contestações civis. De um lado, temos os movimentos contemporâneos que elaboram agendas mais complexas, contraditórias e paradoxais em relação ao atual estágio de permeabilidade estatal no recebimento e assimilação dessas demandas.

Portanto, não se trata de “novos movimentos” no que diz respeito ao caráter substancial das pautas, elas permanecem apoiadas nas mesmas reivindicações históricas de uma sociedade de classes. As últimas experiências internacionais de contestações sociais têm demonstrado que a crescente consolidação da cultura digital e o uso de novas ferramentas resultam em um novo modus operandi da ação política.

Do outro lado, temos um Estado calcado em estruturas administrativas e políticas que não correspondem mais aos anseios dos movimentos contemporâneos. Nesse cenário, as mudanças exigem a renovação do Estado no seu modo de agir politicamente.

As experiências recentes demonstram que as respostas imediatas encontradas pelos governos para crises pontuais de legitimidade passam pelo menos por um (ou mais) desses três eixos: transparência, participação e accountability.

Nesse sentido, o que esses eixos colocam de desafio ao Estado é exatamente a transformação da gestão pública e o estabelecimento de uma nova relação com a sociedade, sendo parte (e não o fim) da resposta conjunta para a voz das ruas.

 

  1. 2.      Governo Aberto: processos de fortalecimento do Estado e de sua relação com a sociedade

 

            Um arranjo que busca mudança de valores, procedimentos e dogmas dos governos: governo aberto - e suas ações concretas no fortalecimento da participação social, transparência, inovação tecnológica e integridade - representa uma agenda política de fortalecimento do Estado e de transformação da sua relação com a sociedade.

Se por um lado, os três primeiros eixos são parte de lacunas históricas da formação política brasileira, a inovação tecnológica vem para ser o elo condutor que vai dar condições de oferecer as respostas no tempo e na interação que o novo modus operandi da ação política da sociedade exige.

Destarte, ao articular os eixos de transparência, participação, integridade e inovação tecnológica, o governo aberto oferece as condições para superar os limites dos arranjos institucionais e instaurar a zona de confluência entre poder público e contestadores sociais. Essa zona de confluência consiste, fundamentalmente, no aumento da permeabilidade do Estado em direção às demandas da sociedade contemporânea.

A prática de governo aberto pode funcionar como uma ponte catalisadora - uma forma de “atalho histórico” - da experiência do cidadão com as instituições democráticas e, consequentemente, o aumento do fortalecimento da democracia estatal e sua legitimidade civil.

 

Figura 1 - Zona de Confluência proporcionada pelo governo aberto

 

 

Concretamente, a agenda de governo aberto possibilita: i) a criação de espaços e canais de participação social; ii) uso e desenvolvimento de ferramentas virtuais de interação, priorização e votação on line; ii) a disponibilização de dados de forma ativa e passiva; iii) processos de prevenção e combate à corrupção, sobretudo por mecanismos de controle social.

Conclusões

À medida que o governo avança nas práticas de “abertura”, é possível notar que a permeabilidade do Estado aumenta e passa a romper os limites institucionais e a ressonância das contestações sociais, por sua vez, também ganha fluidez em direção ao aparato institucional. Isso demonstra que a agenda de governo aberto está em voga pela sociedade nos seus processos reivindicatórios.

Porém, o Estado - ao não aplicar governo aberto como agenda permanente e articulada - ainda se vê refém de crises cíclicas de legitimidade e perda de espaço, pois não consegue articular e formatar estruturas objetivas e subjetivas que assimilem o grau de desenvolvimento da cultura participativa dos atores. Sendo assim, se faz urgente compreender a aplicação da agenda de governo aberto, não apenas como respostas pontuais, mas como práticas de mudanças estruturais e permanentes na relação entre Estado e sociedade.

 

 

Referências Bibliográficas

 

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Apresentação
Última alteração
04/11/2015