Os pressupostos do individualismo metodológico na análise das políticas públicas: uma crítica sob a perspectiva da “totalidade concreta”
Resumo
O presente estudo dedica-se à investigação dos fundamentos sob os quais estão assentados os pressupostos de elaboração das políticas públicas, no cerne das teorias hegemônicas da economia do setor público (a Public Choice Theory e a New Institutional Economics), identificando algumas das suas limitações como inerentes ao individualismo metodológico.
A pesquisa constata que tais limitações não se restringem ao âmbito metodológico, tratando-se, na realidade, de uma questão de natureza ontológica. Essa constatação caminha no sentido de apontar as reflexões trazidas pela ontologia crítica marxiana, sugerindo a noção de “totalidade concreta” como postulado de investigação voltado para a percepção da realidade enquanto complexo de múltiplas relações e determinações diversas. Com base nessa perspectiva, apresentam-se alguns fundamentos para a compreensão do processo de elaboração das políticas públicas, indicando-se a observação das contradições presentes na constituição histórico-concreta do Estado.
Tal perspectiva, enquanto postulado de investigação, aponta um percurso cognitivo que passa pela abstração das categorias essenciais oriundas do próprio objeto investigado, tomando-o assim a partir das suas contradições materiais objetivas. A ontologia crítica faz perceber os fundamentos que subsidiam o processo de elaboração das políticas públicas como fração de uma totalidade concreta, sugerindo a investigação dos seus determinantes a partir da observação das seletividades estratégicas, estruturalmente inscritas na própria materialidade institucional do Estado.
Por essa abordagem, as formas institucionais estatais vão adquirindo contornos estratégico-relacionais intrínsecos, cujas seletividades vão, ao longo do tempo, institucionalizando regras operativas de exclusão, mediante a composição de arranjos, os quais trazem, intrinsecamente, a definição do que poderia ser ou não considerado como efetivamente necessário na elaboração das políticas públicas. Materializa-se, assim, uma espécie de filtro sistêmico que atribui aos processos político-administrativos um interesse específico em direção à reprodução do sistema de acumulação, delineando as políticas públicas em conformidade com um padrão de racionalidade garantidor de um escopo restrito de possibilidades.
Nesse sentido, a abordagem das matrizes espaço-temporais privilegiadas pelos arranjos institucionais emergentes desponta como um bom ponto de partida para a investigação dos fundamentos sob os quais se elaboram as políticas públicas no contexto contemporâneo. Esta investigação teórica divide-se em três etapas: a identificação dos pressupostos inerentes às teorias hegemônicas da economia do setor público, a partir do contexto da sua proeminência; a abordagem das implicações ontológicas do individualismo metodológico, sob os quais se fundam tais teorias e; a o estudo da ontologia crítica marxiana, seguido da discussão sobre a sua potencial percepção do processo de elaboração das políticas públicas.