O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E O CAPITAL SOCIAL: UM ESTUDO DE CASO DA ESCOLA PLURAL
Resumo
O artigo “O sistema educacional brasileiro e o capital social: um estudo de caso da Escola Plural” aborda a relevância da consideração do capital social como um dos determinantes do desempenho e das desigualdades educacionais, faz uma análise do programa político Escola Plural, desenvolvido na rede municipal de Belo Horizonte, e busca estabelecer a relação existente entre ambos: a Escola Plural como tentativa de levar em conta a diversidade do capital social no sistema escolar. A motivação para a escolha do tema abordado no artigo foi o interesse em compreender melhor como algumas falhas do sistema educacional se relacionam diretamente com as privações e desigualdades extra escolares e condições socioeconômicas das famílias. Buscou-se também entender como grupos socialmente vulneráveis se mostram desfavorecidos dentro do próprio sistema de ensino, uma vez que, em média, apresentam desempenhos escolares inferiores e índices de evasão escolar e repetência superiores. Trazemos à tona, então, a análise das desigualdades internas existentes no sistema educacional, sendo estas de naturezas diversas, entretanto, nem sempre compreendidas em suas respectivas singularidades e interações, sendo ora subestimadas, ora supervalorizadas. Compreendemos que a diferença de oportunidades educacionais produz um afunilamento no sistema e aqueles alunos que não obtiveram resultados escolares satisfatórios futuramente estarão em situação desvantajosa no mercado de trabalho, com empregos precários ou mal remunerados, alimentando um ciclo perverso de desigualdade econômica e social, camuflado pela utilização do termo “meritocracia”. Dessa forma, a motivação das autoras acerca do assunto também foi baseada na suposição de que o capital social é um elemento chave na redução de tais desigualdades educacionais, criação de ambientes de maior equidade e, consequentemente, do resgate das promessas de uma educação pautada na igualdade de oportunidades. A discussão parte de uma contextualização histórica da educação no Brasil, na qual é possível perceber que a desigualdade educacional possui raízes profundas e que atualmente o país se situa em um processo de transição, que combina melhorias no acesso e fluxo de algumas modalidades educacionais, de um lado, e deficiências e desigualdades persistentes de desempenho e de conclusão, de outro. É feita então a análise da concepção e manifestação dos tipos de capital – econômico, cultural e social, mantido o enfoque no último, por sua vez compreendido como as relações sociais ou o sentimento de pertencimento gerado pelas redes sociais, sejam elas as famílias, escolas, grupos de amigos e/ou vizinhança, bem como a qualidade e a quantidade dos recursos disponíveis a cada grupo. A partir dessa definição, fundamentada nos trabalhos dos sociólogos Bourdieu e Coleman, trata-se também das suas implicações tanto na estrutura do sistema educacional quanto nas oportunidades de aprendizagem, que diferem, intensamente, entre os grupos que detêm baixo capital social e aqueles que detêm elevado grau. Dessa forma, o artigo abrange a segregação no processo educativo dos grupos socialmente desfavorecidos, revelando também seus efeitos de reprodução da condição excludente à qual são submetidos, já que estes, muitas vezes, internalizam a instituição do “fracasso”. Ainda, relaciona esse insulamento aos entraves enfrentados pelo sistema educacional brasileiro, que podem se referir aos insumos, como professores e sua qualificação, metodologia, estrutura física das escolas e verba destinada à educação, como também aos elementos que os alunos trazem de casa e da comunidade para o ambiente escolar. Tais elementos nem sempre são bem aceitos, valorizados ou, sequer, compreendidos, assim como as necessidades advindas de sua condição social, exemplificadas pelo ingresso no mercado de trabalho de forma prematura, para auxiliar nos rendimentos financeiros da família. O conjunto desses elementos resulta em uma escola degradada, incapaz de oferecer um ensino equânime e de qualidade e, principalmente, incapaz de compreender a diversidade entre os alunos e suas respectivas realidades, o que conduz à subestimação da importância de abraçar os mais díspares contextos sociais como parte essencial do processo de aprendizagem. Assim, é identificada uma limitação das escolas públicas brasileiras que acaba por gerar um elevado grau de abandono e desinteresse por parte dos alunos. A consideração do capital social como dimensão relevante da relação dos alunos com a família e com o sistema escolar é, então, explorada sob perspectiva de conseguir, ainda que com dificuldades, suprir gaps gerados por distintos tipos de vulnerabilidades. Reafirma-se, assim, a importância do apoio social no ambiente escolar, de forma a ressaltar como tal contexto gera maior identificação entre a escola e o aluno em busca de promover ambientes escolares baseados na igualdade advinda do respeito das diferenças individuais. Por fim, é feita uma análise do programa político municipal de Belo Horizonte, “Escola Plural”, lançado no ano de 1994, que buscou contornar tais problemas. A proposta reconheceu o capital social como elemento fundamental da aprendizagem escolar e geração de equidade. Contudo, enfrentou grandes entraves e resistências desde o momento de sua implantação, como é típico de qualquer reforma, ao idealizar transformações relevantes no funcionamento da instituição escolar para um contexto desabituado, culturalmente, com grande parte de suas premissas. Isso se deve ao fato de que ela rompe com vários mecanismos escolares tradicionais e, ao mesmo tempo, inova no que tange à reprovação, ao apego dos professores aos livros didáticos e à avaliação dos alunos limitada às notas das provas. A Escola Plural acabou sendo extinta por não conseguir superar os obstáculos encontrados em seu percurso, de forma que seus resultados positivos não fossem vistos além da teoria. O artigo não se estende na análise de todos os elementos de sucesso e insucesso na proposta da Escola Plural, mas mantém seu foco em, ao tomá-la como exemplo, buscar revelar uma conexão entre alguns resultados observados e a influência do capital social ou sua falta em políticas públicas e programas governamentais que visem a uma reforma educacional.