E-CNH-sp: logros e problemas na utilização de sistemas informatizados na gestão do Trânsito

Dênis Alves Rodrigues, Martin Jayo, José Carlos Vaz

Resumo


A utilização das ferramentas de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) ocorre de maneira desigual dentro da Administração Pública. Embora muitos sistemas sejam desenvolvidos procurando proporcionar maior eficiência aos processos da administração pública, conferir maior qualidade à prestação de serviços do Estado, ou, ainda, buscando ser instrumento de maior transparência e democracia (Cunha e Miranda, 2013[1]), poucos logram êxito.

Assim, a larga utilização desses sistemas não traduz, necessariamente, em seu melhor desempenho ou em uma relação mais democrática com a sociedade, além disto, estes casos nem sempre são analisados. Isto acaba por gerar uma oportunidade de estudo: investigar as dificuldades ou razões para o insucesso de aplicações de TIC na administração pública, sendo importante avaliar sua implantação e os seus resultados, positivos ou negativos.

Particularmente a área de Trânsito tem sido uma grande consumidora destas novas ferramentas, quer seja pelo grande volume de dados que gerencia e compartilha entre os órgãos públicos que a compõem (nos níveis Federal, Estadual e Municipal), ou pelas automatizações de processos. Justificando a afirmativa anterior, temos como exemplo a utilização de sistemas informatizados pelos Departamentos Estaduais de Trânsito (Detran) procurando gerenciar seus dados e processos (Azoubel, 2006[2]; Rodrigues, 2015[3]) os Simuladores de Direção Veicular[4] e os equipamentos de fiscalização de velocidade e semafórica para as vias públicas.

Para exemplificar melhor a volumetria de dados podemos citar os registros de todos os veículos, que em abril/2015 perfaziam um total de 88.075.445[5] no Brasil, além dos dados de seus proprietários, condutores e de suas autuações (multa por infração de trânsito), somados a isto temos as informações sobre outros atores da área de trânsito, que precisam de gerenciamento, tais como os credenciados pelos órgãos de trânsito estaduais, como: médicos, psicólogos e as autoescolas (Centro de Formação de Condutores – CFC), estes que participam dos processos de habilitação (CNH[6]), além dos cidadãos que estão em processo de habilitação.

Assim, torna-se relevante estudar o sistema e-CNHsp, que foi desenvolvido pelo Detran.SP, maior departamento estadual de trânsito do país, para gerenciar os processos de habilitação de condutores, procurando ter maior governança sobre os dados ali inseridos e proporcionando uma melhor prestação de serviço à população paulista, ou seja, aos cidadãos que se utilizam deste sistema para se habilitar[7].

Para evidenciar o volume de informação da área de habilitação deste órgão (Detran.SP), em 2014, foram emitidas 5.267.609 CNH’s[8], incluindo todos os serviços da área de habilitação (CNH), no estado de São Paulo.

É importante ressaltar que o referido sistema (e-CNHsp) veio com o objetivo de substituir seu antecessor, pois o sistema anterior (conhecido como GEFOR) os dados ficavam sob o poder de empresas privadas, sem vínculo e controle por parte do Estado. Esta situação virou objeto de questionamento pelo Ministério Público Estadual e culminou no desenvolvimento do sistema e-CNHsp (através de uma parceria entre o Detran.SP e a Empresa de Processamento de dados do Estado de São Paulo - Prodesp), que, além de substituir as atividades de seu antecessor, foi sendo cada vez mais utilizado para uma melhor accountability (na medida que permitia que os funcionários e cidadãos fiscalizassem as informações ali inseridas pelos atores envolvidos no processo) e divulgação dos dados para os respectivos cidadãos (ao permitir que cada cidadão possa acompanhar as fases de seu processo de hablitação).

Alinhado a esta situação temos a importância de se estudar a aplicação de TIC na gestão das atividades-fim do Estado, já que nestas situações a população percebe melhor os seus impactos e pode avaliar melhor os seus resultados. Por outro lado, historicamente a informatização da Administração Pública privilegiou as áreas-meio e ligadas à arrecadação e gestão de recursos e que, por isso, a informatização das áreas-fim pareceu seguir um ritmo mais lento, como já apontavam Abrucio e Gaetani (2006, p. 23-24)[9].

Desta forma o foco deste trabalho é compreender, a partir da metodologia de estudo de caso (single case), com base em um caso relevante e contemporâneo, como, na prática, estão sendo utilizadas as ferramentas de TIC na área de Trânsito, analisando como de fato ocorreu a implantação do novo sistema e quais os resultados auferidos e os problemas encontrados. Deve-se reforçar que o presente trabalho será realizado com base na literatura sobre uso de TIC na Administração Pública e com base nas capacidades estatais que contribuíram para viabilizar esta implantação.

Obviamente este trabalho não pretende exaurir toda a necessidade de pesquisas de aplicação de TIC na Administração Pública, cobrindo toda a lacuna já debatida, mas pretende contribuir analisando um caso relevante e extraindo os seus resultados, o que pode colaborar, também, com outros gestores públicos que pretendam implantar sistemas informatizados na área de Trânsito.

 

 

 


[1] Cunha, Maria Alexandra; MIRANDA, P. R. M. O Uso de TIC pelos Governos: uma proposta de agenda de pesquisa a partir da produção acadêmica e da prática nacional. Organizações & Sociedade (Impresso), v. 66, p. 543-566, 2013.

[2] AZOUBEL, F. Administração de departamentos de trânsito: desafios e soluções para a gestão pública. Recife: Livro Rápido, 2006.

[3] RODRIGUES, Dênis A. A nova agenda da gestão pública brasileira: estudo de caso do Detran-SP. Dissertação de Mestrado. Universidade de São Paulo. 2015.

[4] LUCAS, Felipe R, et al. Uso de simuladores de direção aplicado ao projeto de segurança viária.  Bol. Ciênc. Geod., sec. Comunicações/Trab. Técnicos, Curitiba, v. 19, no 2, p.341-352, abr-jun, 2013.

[5] Informações extraídas do sítio eletrônico do DENATRAN – Departamento Nacional de Trânsito. Disponível em: http://www.denatran.gov.br/frota2015.htm. Acesso: 20 mai. 2015.

[6] Carteira Nacional de Habilitação.

[7] Dentre os serviços de habilitação para uma determinada categoria podemos citar: Primeira habilitação (permissão para dirigir), adição de categoria, mudança de categoria.

[8] Conforme relatório do Programa Plurianual - PPA - 2014.

[9] ABRUCIO, F. L.; GAETANI, F. Avanços e perspectivas da gestão pública nos estados: agenda, aprendizado e coalizão, in:  Avanços e Perspectivas da Gestão Pública nos Estados. CONSAD e FUNDAP. 2006. p. 19-80.


Apresentação
Última alteração
02/09/2015